Se tem uma coisa que não se pode negar é a capacidade incrível que o cinema tem de transportar histórias a todos os tempos e torná-las atuais e acessíveis por meio de uma nova roupagem, linguagem ou outro meio. Uma prova disso é a chegada aos cinemas da adaptação do livro “Assassinato no Expresso do Oriente”, uma das obras mais famosas e icônicas da senhora do suspense, Agatha Christie.
Originalmente publicado em 1934, a obra está em vias de completar 84 anos de lançamento e, definitivamente, é o romance pelo qual a autora é mais lembrada, dentre sua extensa obra literária. E um dos principais motivos para isso é que o livro inverte de maneira magistral a lógica costumeira dos romances investigativos/policiais, típicos de outros livros dela mesma, como o “Caso dos Dez Negrinhos” (reeditado como “E não sobrou nenhum”) e “A casa Torta”. “Assassinato no Expresso do Oriente” é corajoso e inovador nesse sentido, buscando um arremate que fuja bem à convencionalidade.
Na história, o mundialmente famoso detetive Hercule Poirot (Hercule e não Hercules, ele não gosta deste engano), acaba de solucionar um caso em Jerusalém e é convidado a resolver outro em Londres. No filme, ao contrário do livro, vemos claramente a resolução do crime de Jerusalém, em uma cena super movimentada. Por um acaso do destino ele consegue de última hora uma passagem no incrível Expresso do Oriente. Durante a viagem, um dos passageiros é misteriosamente assassinado e Poirot é o único capaz solucionar o crime antes que o trem chegue ao seu destino. Com inigualável habilidade analítica, o detetive começa a captar as pistas e interrogar os suspeitos um a um, e, com isso, começa fazer muitas descobertas sobre o passado de cada uma daquelas pessoas, incluindo o próprio morto. Até culminar no clímax da história e no plot final incrível.
A mais recente adaptação que chega aos cinemas no próximo dia 30 de novembro traz um novo frescor à obra quase centenária e encabeça uma lista novas adaptações de clássicos da escritora, como é o caso do livro a “Morte no Nilo” que também ganhará sua adaptação. Assim como em 1974, a nova versão do “Assassinato no Expresso Oriente”, conta com uma lista extensa de grandes atores, como Judi Dench, Michelle Pfeiffer, Willem Dafoe, Daisy Ridley, Johnny Depp, Josh Gad, Penélope Cruz e Kenneth Branagh, que além de interpretar o protagonista Poirot, ainda está à frente da direção do longa. E, em tela, não há como tirar os olhos de Branagh, ele tem uma presença fantástica e convence no papel do homem que consegue mesclar melancolia, humor, agilidade, sagacidade, além de um forte código de ética e traços de TOC. Michelle Pfeiffer e Penélope Cruz também arrasam, a primeira ainda mais, tendo em vista sua personagem nitidamente instável e traumatizada.
Com um bigode que chega primeiro, Branagh imprime ao protagonista uma vivacidade diferente do livro. Temos um detetive mais ágil e forte, mas com certeza, uma das características que mais me chamaram atenção no quesito diferenças, foi seu humor. No filme Poirot é bem mais humorado e dono de um humor mais ácido, coisa que atribuo à intenção de fazer com que as pessoas gostem mais dele e criem empatia com o personagem que ainda vai aparecer novamente em outras histórias, afinal, salvo exceções, ninguém gosta de um protagonista chato e carrancudo. Outra diferença importante é que no filme, absolutamente todas as pessoas o endeusam. Além disso, como boa parte do livro se dá com o detetive interrogando os suspeitos, no filme há mudanças de cenário durante essas conversas para que não ficasse chato e cansativo.
Outra coisa que merece destaque é que o filme pontua momentos de racismo, xenofobia, fanatismo religioso, entre outras questões, hoje tão atuais, de maneira a não deixá-los passar despercebidos. Mas, assim como livro, o filme é um pouco lento no meio, justamente neste momento quem que estão sendo introduzidos todos os suspeitos. Contudo, nada que atrapalhe seu desenvolvimento.
Enfim, o filme adapta de maneira muito satisfatória um dos romances policias mais famosos do mundo e homenageia de forma elegante tanto Agatha Christie quanto os clássicos do gênero investigativo. É uma ótima opção para se divertir, e quem não conhece o livro ou nada da autora provavelmente também vai sair satisfeito.
Veja o trailer:
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