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[Resenha] Um exú em Nova York  – Cidinha Silva

por Elis Rouse
5 minutos de leitura

Um exú em Nova York  – Cidinha Silva

Um exú em Nova York é o 13º livro da escritora mineira Cidinha Silva. Vencedor do Prêmio Literário Biblioteca Nacional de 2019, categoria conto, a obra é uma publicação da editora Pallas

Cidinha Silva:

O leitor mais atento sabe que as feiras independentes e pequenos eventos literários, são verdadeiras preciosidades para além de valorizar a literatura nacional, apresentar novos autores, aqueles que infelizmente passam longe das vitrines das grandes livrarias, editoras e monopólios do país.

A propósito dos eventos, eles são ainda um espaço importantíssimo para evidenciar e destacar as editoras independentes, justamente as que dão espaço para autores como Cidinha Silva, um nome para ser apreciado, sem moderação. Enaltecer esses autores e suas editoras é um dever do leitor.

Cidinha Silva apresenta uma literatura potente, ao mesmo tempo em que sutil e poética. Sua escrita valoriza e resgata a cultura africana, tão essencialmente importante nos dias de hoje, registrando e eternizando relatos de verdadeiro e valoroso aprendizado para o leitor.

Cidinha Silva é um nome constante no cenário literário mineiro. Reconhecida por sua literatura poética, que entretém, conscientiza e ensina o que parte da população brasileira não aprendeu na escola ou casa, o respeito à cultura a africana.

Conheça mais sobre ela clicando aqui

Um exú em Nova York:

O título é intrigante. E antes mesmo de iniciar a leitura, já instiga a nossa imaginação. 

Um exú em Nova York é um livro curtinho, com pouco mais de 70 páginas e 19 contos. Alguns realmente se passam na cidade americana de maneira mais atual, contudo outros são verdadeiros resgates históricos, das histórias de desfavelamento e Brasil império.

Não há uma linearidade ou sequência, embora o leitor seja literalmente inserido no contexto da cena, transitando em parceria com os personagens. São relatos, narrações de experiências da autora e outras histórias exclusivamente femininas, que só destacam a pluralidade de personagens e cenários. Destaco aqui as referências às cidades mineiras, e locais de nosso convívio, que torna a leitura acolhedora.

Nesses contos, implicitamente e levemente, Cidinha chama atenção para questões pertinentes à cultura africana e da mulher, como a violência, intolerância, racismo e outros. Abrindo nossas mentes e coração para entender mais sobre os ritos da cultura, historicamente demonizados pela sociedade brasileira.

Alguns trechos que despertaram minha atenção e reflexão.

Intolerância:

 “Quebra! Quebra! Quebra em nome de Jesus! E Jesus se encolhia num canto, assustado por usarem seu nome na contramão de princípios humanistas.” (pág.21)

Crítica social:

“As irmãs Mérdia eram pessoas decentes, diferentes dela. Tinha Marçulena, a Mirizante, a Mortuária e a Múrcia. Sobre o registro delas, o juremeiro é quem fazia chacota, oficial de cartório só encrenca com nome de preto.” (pág. 29)

Transformação social:

“Alguém devia olhar para isso que fazem com a gente. Rosa de Matamba não se referia à expropriação dos moradores pela especulação imobiliária, mas ao recente movimento no Morro de sequestro da casa de algumas pessoas para compor o bonde de processamento da pasta-base.” (pág.61)

Literatura em movimento:

“Caminha até a encruza central do Morro do Papagaio, abaixo da sede do Muquifu, prédio tombado pelos meninos do movimento. No percurso reconhece pessoas, lutas, desapropriações, resistência popular, tiros, medo, angústias. O padre amigo a abraça quando ela passa pela Igreja das Santas Pretas. Oferece companhia, ela não quer. Está bem. É só dela o cortejo. “ (p. 72)

Nossa vivência nem sempre está preparada para tantas doses de conhecimento, por isso, tive dificuldades em entender algumas palavras e expressões na língua ioruba, recorrendo por diversas vezes ao Google, e fazendo várias leituras de um mesmo conto. No final havia um glossário preciso e pertinente à minha espera, mostrando o cuidado da editora e da autora com o leitor.

Os contos que mais gostei “Lua Cheia” e “Mandachuva” foram justamente os que tinham uma história mais densa e construída, mereciam pelo menos mais umas 100 páginas.

Um exú em Nova York é uma leitura de consciência e sabedoria.

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