O Alienista | Machado de Assis

Será que alguém nesse mundo é de fato normal?

Publicado em 1882, O Alienista é um livro bem curtinho, dividido em 13 capítulos, com cerca de 80 páginas a depender da edição. Na verdade é um conto um pouco mais extenso, e alguns críticos o consideram uma novela.

O tema central da obra é um debate sobre a sanidade e a normalidade humanas e até que ponto estamos aptos a afirmar o que é ou não é ‘normal’.

Na história, narrada em terceira pessoa, o protagonista  Dr.Simão Bacamarte, o nosso Alienista, que antigamente era  termo usado para designar um médico psiquiatra, aquele que cuida de alienados, ou seja, pessoas loucas,  é dito como um médico muito conceituado no Brasil e no exterior.

Depois de muitos anos fora, ele volta para sua terra Natal, Itaguaí, no interior do Rio de Janeiro e decide se casar com dona Evarista, uma mulher que como ele mesmo dizia, não era lá muito simpática e muito menos bonita, mas continha boa saúde e condições físicas para lhe dar  que ele queria: filhos.

Acontece que o Doutor não conseguiu ter seus queridos filhos a acabou se concentrando nos estudos da psiquê humana e começa a ficar muito fissurado pelo tema. Sabendo das condições dos ‘loucos’ na pequena vila, ele inicia o projeto de construir um abrigo para eles possam se sentir melhor, mais acolhidos e possam receber um tratamento adequado.

O Alienista também tem certeza absoluta que vai conseguir, por meio dessa casa, definir o que é a loucura, como ela acontece, separar os tipos de loucura existentes e, principalmente, descobrir a cura da loucura. Ele decide pedir autorização para construir uma casa para acolher os loucos da cidade e consegue. É aí que nasce a Casa Verde, que ganha esse nome por suas grandes janelas pintadas de verde, capa de algumas edições inclusive. Logo a casa começa a receber os pacientes da cidade e até mesmo de cidades vizinhas e o médico se dedica mais e mais em estudar os ‘doentes’.

“Dividiu-os primeiramente em duas classes principais: os furiosos e os mansos; daí passou às subclasses, monomanias, delírios, alucinações diversas. Isto feito, começou um estudo aturado e contínuo; analisava os hábitos de cada louco, as horas de acesso, as aversões, as simpatias, as palavras, os gestos, as tendências; inquiria da vida dos enfermos, profissão, costumes, circunstâncias da revelação mórbida, acidentes da infância e da mocidade, doenças de outra espécie, antecedentes na família, uma devassa, enfim, como a não faria o mais atilado corregedor. E cada dia notava uma observação nova, uma descoberta interessante, um fenômeno extraordinário.

O problema e na verdade o grande humor e crítica da história se inicia quando Dr. Bacamarte começa a ver todo mundo como louco e interná-los no manicômio. Um a um, os moradores da cidade vão sendo diagnosticados e enfiados na casa verde. Logo, cerca de 75 % do moradores já estão internados e isso acaba gerando uma grande revolta na cidade. Entretanto para a surpresa de todos a revolta não gera grandes repercussões e em seguida os revoltosos começam a ser internados também.

Aos poucos, o Alienista começa a perceber que: se a maioria das pessoas se parece na forma de pensar, definindo assim um padrão na ‘anormalidade’, ele, como o único que pensava fora do padrão, não seria então o único verdadeiramente ‘anormal’? Ao chegar a essa conclusão ele manda soltar todos os presos no manicômio e, voluntariamente se interna na Casa Verde.

Esse conto foi publicado em partes dentro de uma revista da época e em seguida foi publicado na íntegra no livro no livro Papéis Avulsos e inaugurou a fase realista de Machado de Assis. É a partir de O Alienista que características tão marcantes na escrita do autor começam a aparecer, tais como o humor ácido, as críticas sociais contundentes e veladas, ou por vezes nem tão veladas e, claro, personagens psicologicamente bem aprofundados e cheios de camadas.

Nessa obra tão curtinha, Machado consegue inserir diversos elementos da cultura da época, bem como construir um cenário que vai transmitido ao leitor o aumento da tensão na cidade, nos levando a perceber que algo está prestes a dar errado, explodir. Além disso, dentro de poucas páginas ele consegue analisar, de maneira criteriosa e muito bem construída, as nuances da sanidade e da loucura.

O Alienista cumpre muito bem o papel de deixar no leitor um formigamento atrás da orelha, aquele comichão questionador: Será que o ‘normal’ existe?

Ler Machado de Assis, Machadão para os íntimos, pode parecer, a primeira vista, um bicho de sete cabeças. Mas eu te pergunto, você já viu alguém ganhar a guerra sem enfrentar o dragão? Tenho certeza que não! Muitas vezes a gente estabelece bloqueios sem nem mesmo ter tentado, dado uma chance pra leitura. Eu já virei o nariz para Dom Casmurro, e hoje ele é apenas o meu livro preferido de toda literatura nacional, meu TCC foi sobre ele. Então amigo, abra a mente e venha conhecer um pouco mais sobre outra maravilha do Machado, O Alienista.

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