E Agora, Mãe? – Isabel Vieira
E agora, mãe? Foi uma das leituras obrigatórias dos estudantes da década de 1990. É um livro intenso, com uma carga emocional muito forte, e uma prestação de serviço necessária até mesmo quase 30 anos depois do seu lançamento.
De todos os livros que li na escola esse é o único que me marcou profundamente e um dos poucos que eu me lembro da história do início ao fim. Tinha 15 anos e fiquei muito impactada quando terminei de ler. E agora, mãe? é daqueles livros que despertam vários sentimentos com uma história simples permeada de delicadeza, luta e amor. É muito bom indicar uma história que sempre esteve presente na minha vida.
O livro, é da jornalista Isabel Vieira, que já publicou mais de 20 obras, todas voltados para o público adolescente, tema bem conhecido dela que já trabalhou na Revista Capricho. O livro foi publicado em 1991, com o tema polêmico para época, gravidez na adolescência e as consequências que ela acarreta para a jovem mãe e o pai, e como atinge também o meio onde vive, a família e os amigos.
E agora, mãe! conta a história de Jana, uma adolescente graciosa de 14 anos, sonhadora e determinada a realizar o seu sonho que é ser bailarina. Jana namora firme com Ivan, dois anos mais velho que ela, de “família boa” e com um futuro brilhante pela frente.
Uma gravidez inesperada muda o destino dos dois. Ao saber da gravidez, os pais de Ivan decidem manda-lo para fora do Brasil. Os pais de Jana se culpam pelo “erro” da filha e Jana tem que lidar com o preconceito escancarado da época, a decisão de ter ou não o filho, o dilema de abrir mão do seu sonho e construir uma nova vida. Mesmo hoje, em pleno 2020, sabemos que a carga de responsabilidade de uma gravidez recai totalmente sobre a mulher, mudando totalmente sua rotina.
O livro se passa em uma época em que as pílulas anticoncepcionais eram usadas pelas adolescentes para encorpar os xampus (eu já fiz isso) para o cabelo crescer mais rápido. Jana, acreditando que não engravidaria na primeira vez, só começa a tomar a pílula, sem qualquer orientação, depois da primeira relação. E claro que a culpa da gravidez recai toda sobre ela e a família, que segundo as más línguas deu liberdade demais para a moça.
Uma geração que culpa a televisão pelos impropérios da vida. Em meio à sociedade preconceituosa, ser mãe solteira não é nada fácil. Com o abandono de Ivan, o desprezo do pai, a desconfiança da mãe, Jana tem o apoio da empregada Lurdes, da tia Ligia e de uma única amiga do colégio a Talita, que é uma das minhas personagens preferidas. Aliás, gosto de como Isabel construiu os personagens, eles são comuns e de fácil identificação.
A história de Jana é como costumo dizer, fácil de acreditar e de acontecer. Poderia ser eu, você, uma amiga, mas com certeza conhecemos alguém que passou por uma gravidez na adolescência.
Gosto de como Isabel contextualiza a história de Jana com o momento político e econômico do país e a condição da mulher diante dos inúmeros preconceitos sociais da época. De como ela não romantiza a gravidez expondo todos os problemas enfrentados pela personagem e a maneira como encara cada um deles.
As analogias da história de Romeu e Julieta com a realidade de Jana e Ivan são pertinentes e bem inseridas no romance. A escrita de Isabel é uma delícia de ler, a leitura é ágil e vai te inserindo dentro da história. Quando termina dá a impressão de que Jana continua vivendo em São Paulo e encarando outros problemas que a vida, que segue, ainda vai apresentar.
Quase 20 anos depois de ter lido pela primeira vez, agora me identifico com a tia Ligia, uma solteira convicta, bem sucedida que vive um dia de cada vez, mas, confesso que por muitas vezes o destino de Jana me assombrou com o medo de não conseguir realizar os meus sonhos por conta de uma gravidez.
A personagem é fictícia, mas retrata a realidade de muitas adolescentes que substituíram os seus sonhos em prol de uma criança que não pediu pra nascer, mas que precisa ser amada e protegida.
E agora, mãe? É livro útil! E um exemplo de quando as escolas acertam em adotar como leitura obrigatória um livro que ensina e adverte, mas mostra que, por mais que o caminho seja árduo, quando existe uma possibilidade de vitória deve-se lutar para alcança-la.
Obs. Sempre quis ter esse livro na minha estante, mas o preço que varia entre R$35 é R$ 40 é um absurdo diante do cenário de crise que passa o mercado literário nacional.
Conheça mais sobre a autora Isabel Vieira, clicando aqui.
A edição mais recente do livro (e mais linda) foi publicada pela Editora Moderna.
1 comentário
Li quando tinha 13 anos. Impossível não ficar tocada. Lia muito nessa época, mas nenhuma história mexeu tanto comigo como essa. Até mesmo para uma certa inconformidade em relação a seus rumos e seu final. Atualmente reli e percebi que é grande a influência do momento histórico para um sofrimento constante da protagonista. E parece tão forte isso. Afinal a garota e seu namorado eram ambos mal instruídos sobre o assunto e ela acabou engravidando. E incrível ver a inércia dele perante pais orgulhosos e extremamente ignorantes. Inércia que durou 5 anos e que acaba no fim apenas quando os próprios pais aparentemente cedem. E parecem ambos serem perdoados e recompensados no fim com uma linda garotinha já criada, toda engraçadinha. Como pode o rapaz ter simplesmente nunca ter demonstrado em 5 anos qualquer tipo de vontade, por mais que a sentisse de sequer saber da namorada que ele tinha abandonado grávida, sem sequer dizer adeus, saber do nascimento da filha por carta pelo irmão, não esboçar sequer reação? Nunca, jamais procura-lá para saber como estava? Voltando para o país ainda por cima engata namoro e noivado com outra garota com quem estudava e já tinha inclusive ficado enquanto ainda namorava? Aí pra coroar, no fim conquistando rapidinho o amor da filha ignorada até então, facilitado pelo fato de ela ser uma criança de 5 anos, e nunca ter recebido da mãe as mágoas evidentes dela por isso, e se casar com essa com a filha ainda sendo aia? Por mais que tente-se demonstrar que a Protagonista entenda e perdoe tudo, é totalmente descrivel que mágoas como essas se sabem assim do nada. Eu até hoje crio na minha cabeça a continuação dessa história. Não é o possível que alguém continue sendo um filhinho de papai e seja constantemente recompensado por isso. Ele, assim como os pais teriam que sofrer alguma consequência para entender o mal que causaram. E tudo que perdeu por isso.