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[Conto] Sereia Negra

por Redação LiteralmenteUAI
8 minutos de leitura

Sereia Negra

Por: Tereza Cristina Ferreira de Oliveira

Sereias são curiosas!

Sereias são alegres, vaidosas, lindas e leves. Adoram tomar sol nas pedras, cantar, se pentearem e gastam bastante tempo nisto.

Você acredita em sereia? E sereia negra? Já viu alguma?

Se disser sim a uma destas perguntas, vai me entender rapidinho. E se só disser não, abra sua mente e seu coração, pois vou contar minha história.

Sou uma sereia negra!

Ilustração: Virgínia Frões

O mundo das águas profundas é dividido em dois reinos. Metade do meu tio avô Poseidon (este você já conhece) e a outra metade do meu avô Miramar. Poseidon é bravo! Revolta as águas, causa terríveis tempestades, grandes tormentas, maremotos e ondas gigantes. Já meu avô é manso! Ama o mar tranquilo, produz as marolas, brisas suaves e até ajuda a desencalhar os navios. Ambos vivem no mundo mágico das sereias, ninfas e dos monstros marinhos. Cada um tem seu jeitinho e na maioria das vezes se dão bem. Irmãos são assim mesmo, né?

Você sabe como nasce uma sereia?

Vou te contar: em nosso reino não temos sereios. Então quando uma sereia se torna adulta recebe uma concha com uma pérola dentro e com ela uma missão. Tem que cuidar da concha e da pérola durante cinco anos e vou te dizer:  

É um longo tempo demais. Então, numa cerimônia grandiosa, a concha é aberta e sai dela uma linda sereia filha. Nasce bem pequena mesmo, mas rapidinho já fica uma sereinha de bom tamanho (a gente cresce muito rápido).

Mas nisto tudo tem uma lei muito séria, que ninguém pode desobedecer. Não se pode abrir a concha antes da cerimônia. Se fizer isto, acho que é expulso ou coisa e tal. Deve ser um grande castigo.

Minha mãe é a filha mais nova do reino e uma das mais bonitas. Quando ficou adulta ganhou sua concha filha e aí começa nossa história.

Sereias são curiosas!

Estava eu na minha concha e minha mãe sobre uma pedra. Eu podia ouvir seu canto e o barulho das ondas do mar. Já estava meio cansada de ficar na concha e resolvi começar um dialogo.

– Oie! Oie! Tem alguém aí?

Minha mãe ouviu e ficou muito assustada. Conchas não podem conversar.

Tentei de novo: – Oie!

Então ela respondeu:

_Shhh! Estou aqui, mas não podemos conversar agora. Só no dia da cerimônia.

_Será que não pode abrir a concha um pouquinho para eu dar uma mudada nos ares? Tipo, ver uma coisa diferente destas paredes brancas? – Insisti com ela.

_Não mesmo! É proibido! – Ela me respondeu.

Mas, como vocês sabem, sereias são curiosas. Na tarde seguinte, no nosso momento pedra e pentear cabelos, ela abriu a concha um pouquinho. Acordei assustada com uma luz muito forte. Quando olhei para fora, vi a criatura mais linda do mundo. Acho que ela também me viu, mas se arrependeu e fechou a concha rapidamente.

Na tarde seguinte, insisti de novo. Sereias também são bem insistentes.

_Vamos conversar! Me deixa sair um pouco, depois volto para concha e ninguém vai saber.

Então ela abriu a concha e eu sai. Quando minha mãe me viu ficou muito assustada. Eu era uma sereia diferente. Uma sereia negra. Minha mãe logo pensou, abri a concha antes do tempo e a luz escureceu a pele dela. Coitada, a pele ainda não estava pronta. Agora todos vão saber que abri a concha. Temos que fugir. Ela não me disse nada, mas sereia também tem um pouco de telepatia.

Voltei para a concha e fomos ao palácio. Ela pegou as coisinhas dela de sereia: um pente, um espelho, alguns colares e pulseiras. Assim que nos afastamos do castelo ela abriu a concha novamente e fomos nadando juntas.

Ilustração: Virgínia Frões

Eu cresci bem rapidinho (nosso tempo é diferente, você sabe). Fomos nadando, nadando por aquele mar sem fim. Era tanto azul, tanta onda, tanta marola, que cansei. Paramos em uma rocha para descansar e pentearmos nossos cabelos, já esgadanhados por tanto exercício.

De repente, nos vimos presas em uma rede. Debatemos-nos tentando fugir e cada vez nos enrolávamos mais. Fomos puxadas para um barco de pesca. Um homem com cara de mau nos amarrou no convés. Ouvimos quando ele falava para o companheiro:

_Vamos ficar ricos! Vamos abrir um aquário gigante e cobrar para as pessoas verem estas sereias. E ainda tem uma sereia negra! Isto é que é sorte!

Neste momento olhei para minha pele e para a da minha mãe. Eram bem diferentes mesmo. A dela era tão branca que parecia um papel e a minha escura como a noite. Sussurrei baixinho:

_Mãe… Por que sou tão diferente?

Ela não me disse nada. Só me abraçou. Acho que a verdade ficou bem escondida no coração dela.

Descemos do barco e ficamos presas em uma casa. Os homens saíram. Aproveitamos para fugir. As sereias quando ficam muito tempo longe do mar, adquirem pernas. Como agora tínhamos pernas, pernas para que te quero. Fugimos esbaforidas!

Fomos em direção ao mar. Ao entrarmos na água as nossas caudas foram voltando e com pouco tempo, já éramos sereias de novo. Fomos nadando, nadando, até que… outro susto!

Os monstros marinhos guardiões do meu avô, aparecerem de repente. Tinham cara de cansados e estavam de mau humor.

_ Já rodamos meio mar atrás de você Iramar. Entre na carruagem marítima e vamos para casa.

Minha mãe ficou calada o tempo todo durante a viagem. Tinha cara de triste e preocupada.

Quando chegamos ao castelo meu avô já estava na porta. E para nossa surpresa recebeu minha mãe de braços abertos e disse para ela:

_Nunca mais faça isto! Você quase me mata de preocupação.

_Pai tive medo do seu castigo. Eu abri minha concha filha antes da hora e minha filha ficou com a pele escura_Ela sussurou

Meu avô sorriu e abriu os braços para mim, sorrindo ainda mais. Falou então com minha mãe:

– De tempos em tempos, escolhemos uma sereia para ser rainha e ela é bem diferente das outras. Eu escolhi você para tomar conta dela. Fui eu quem colocou a perola negra em sua concha.

– Mas pai… e o castigo?

– Você acha mesmo que as outras sereias não abrem as conchas antes da hora? Tolinha!

As sereias são mesmo muito curiosas!

 

Conto de autoria da Dra Tereza Cristina Ferreira de Oliveira. Ela é médica radiologista da Redimama e, nas horas vagas escreve  lindos contos e crônicas.  A Dra Tereza cedeu gentilmente seu conto Sereia Negra para publicação e nós agradecemos imensamente a confiança. As ilustrações de destaque e no texto são da ilustradora mineira, Virgínia Frões, que gentilmente nos deu uma pequena prévia do seu imenso talento. Virgínia será nossa autora do mês de fevereiro. Prepare-se para conhecer quadrinhos atuais e super inteligentes. Conheça aqui alguns dos seus quadrinhos.  

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1 comentário

Graca 20 de novembro de 2018 - 19:32

Adorei a sua história Tereza ! Muito divertida! Parabéns !

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